sexta-feira, 15 de junho de 2012

Um cenário violento

O cenário nas décadas de 20 e 30.

Os sertões do nordeste brasileiro no início do século XX foram o cenário e o refúgio de pessoas que derramaram muito sangue. Além da seca castigante, do descaso político, do total abandono da população pobre do Nordeste, ainda era preciso sobreviver ao cenário de grande violência e de ausência de direitos.


 No período compreendido entre 1920 e 1930, já não havia mais o cangaço romântico praticado por cangaceiros que se mostravam próximos do povo e foi época marcada pelo cangaço mais violento, em que são muitos os exemplos de matança com o proposto de roubar e de ampliar a fama dos seus ícones.


No entanto, a violência não estava apenas refugiada na caatinga, nas temidas figuras dos cangaceiros. É o que explica o professor da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), historiador Lemuel Rodrigues. 

Para uma compreensão da temática da violência no contexto do cangaço, Lemuel lembra que é preciso entender a violência de forma ampla:
“Precisamos lembrar que o sertanejo sofria a seca e tinha poucas oportunidades. Se não fosse comerciante, se não tivesse acesso aos estudos como as famílias da elite, seria agricultor, policial ou cangaceiro. Era o tempo do coronelismo em que os grandes fazendeiros detinham o poder político, oprimiam e mandavam na polícia e esta atendia aos seus interesses. Esse era o cenário na época. O Estado não oferecia proteção e nem garantia dos direitos e o cidadão precisava se armar para defender a sua vida e de sua família. Por isso a violência não estava apenas no cangaço”, explica.

A mulher sertaneja

Nesse ambiente, o professor lembra sobre como a mulher sertaneja dessa época, totalmente subserviente ao modelo patriarcal, era alvo constante de violência:


“A mulher dessa época sofria violência do Estado que a considerava inferior. Mas ela era alvo de violência dentro da própria família. Não se podia falar de cidadania à mulher como se fala hoje. Algumas mulheres se destacaram, mas foram casos isolados dentro de uma sociedade puramente machista”, analisa.

Quando observados os casos de violência a mulheres pelos cangaceiros, havia o sequestro de meninas para que elas lhes servissem no bando, quando não eram violentadas, ou mesmo ferradas (com ferro quente) no rosto como acontecia com as vítimas do cangaceiro Zé Baiano.

“Sabemos que existem pesquisadores que olham o cangaceiro como bandido e outros que o observam como frutos da sociedade dessa época. Porém, o que prevaleceu enquanto memória na imprensa é a visão do cangaceiro como bandido, perigoso e violento, e precisamos pensar mais sobre esses discursos. Sabemos que a própria polícia na época agia com a mesma violência em relação aos cangaceiros, uma prova disso é a imagem das cabeças degoladas quando do ataque surpresa ao bando de lampião.

Uma prática (de degola) que remete a outros momentos da história como foi feito com Tiradentes, por exemplo. Era uma forma de mostrar poder e de que servisse de exemplo para os outros”, relembra Lemuel.

Dizem alguns pesquisadores que com a entrada de algumas mulheres ao bando de Lampião, houve uma maior sensibilização para os atos de crueldade contra inimigos e contra outras mulheres:

“As mulheres, de acordo com alguns pesquisadores, sensibilizaram o ambiente do cangaço porque a própria presença feminina ali acalmava. Elas humanizaram as feras”, ressalta Lemuel Rodrigues.

 Lemuel Rodrigues é atualmente o presidente da Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço (SBEC) e professor da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN),  e historiador.

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fonte: defato.com



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